Afreekassia é um jovem talento surgindo no Rap Nacional, e que carrega em sua arte uma importante auto-afirmação da negritude feminina!
Pensar na condição de uma Mulher Preta no contexto atual de uma Diáspora Afrikana perversa, é uma busca constante de maneiras para driblar a morte mental. Dito isso, peço mais uma vez Agô a ancestralidade que nos toma, para transpor sentimentos e palavras sob obras de várias Artistas.
Ressaltando a importância da existência de cada Mulher Preta na reorganização social, desde o período colonial, reconfigurando por meio de resgates a memória ancestral Afrikana, ritualística, danças, língua e histórias sagradas contribuindo assim para a formação de uma identidade Preta.
Me debruço sob as letras assertivas de Afreekassia! Embaladas em beats, com um flow envolvente de deixar a pista fervendo. Tida como uma tendência na música Preta Global, conecta arte, bom gosto e posicionamento.
Sua descrição para o Youtube:
Nascida e criada no litoral paulista, Afreekassia traz uma nova narrativa para a cena. Com referências do Afrobeats, rap e funk, suas músicas são reflexos sobre o contexto de uma Mulher negra brasileira. Iniciou sua carreira musical como DJ em 2016, e vem consolidando sua pesquisa em ritmos afro-diaspóricos. Após um hiato de 2 anos, a artista dá inicio à uma nova fase em sua carreira como rapper com o single “Sou + as Negras”.
Suas letras trazem elementos e abriga informações importantes enquanto Povo, dentro de uma perspectiva atual. Senti, ao ouvir a presença marcante do dance hall intitulada pela Artista por “Punanny Sound System”, junto a vibração do funk. Pondo suas vivências íntimas entendendo que são em real, questões coletivas que só outra Mulher Preta entenderia.
Isso me remete ao movimento Sankofa, retratado no símbolo Adrinka bem conhecido atualmente… Os Andrikas são um conjunto de símbolos do Povo Ashanti, atualmente localizados nos países Gana, Burkina Faso e Togo, na Afrika Ocidental, também presentes em outras partes do globo. Os Ashantis de Gana usam os símbolos Andinkras para representar provérbios ou ideias filosóficas. Sankofa ensinaria a possibilidade de voltar às raízes, para expandir o potencial e avançar. Sendo assim a realização do Eu, individual e coletivo.
Afreekassia vem de um núcleo de Mulheres Pretas e por frequentar instituições de ensino particulares e espaços majoritariamente brancos afastou-se de uma realidade que gerou uma defasagem em seu processo de construção de identidade. Sendo a arte esse fio condutor de uma reafirmação necessária. Criou em 2017 o Portal Umoja, projeto inspirado Umoja Uaso, uma vila matriarcal no norte do Quênia que foi criada por Rebeca Lolosoli para proteger outras mulheres da opressão feminina.
Sob forte influência da Cultura Sound System (semeada em Kingston na Jamaica, no final da década de 40), surgindo como uma alternativa ancestral e econômica.
As frequências sonoras pulsando nos mínimos detalhes, através de um paredão estrategicamente posicionado. Onde o som é transformado em um portal, e a mensagem é transmitida em sua máxima potência. Uma Cultura para além da pressão sonora.
Afreekassia põe as cartas na mesa. Com o pé na porta, mostrando quem é, e o que quer. Quer todo luxo, conforto e liberdade que o dinheiro pode possibilitar. Desmistificando assim, a imagem que Mulheres Pretas e Dinheiro são rivais. Quando em verdade somos o Povo do Ouro, advindas de Reis e Rainhas.
“Eu quero make, money, money
Make, money, money, money
De ouro eles se banham
De ouro me banharei”
“Princesinha da Baixada”
Letra: Afreekassia/Instrumental: Attlanta)
Diretamente da Baixada Santista, seguindo uma estética Diaspórica…
“(…) marquinha de sol, curtindo um rolê, fugindo dos botas.”.
Essa faixa Afreekassia visionária, entende seu lugar no mundo. Contrariando as estatísticas de um País Racista.
“(…)Ela é Princesinha da Baixada
Naipe de Patrícia e a Postura de Mandraka
Ouro no pescoço e a unha decorada
Ninguém banca ela, por que ela é muito cara…”
A visão posta aqui é que Uma Mulher Preta pode sim, ter sua grana, bancar seus luxos sem esquecer suas origens e princípios.
“Sou + as Negras”
Letra: Afreekassia – Instrumental: G.a.B.o)
Essa faixa Afreekassia afirma e reafirma sua percepção referente a sua existência enquanto Mulher Preta. Exaltando sua derme, seus traços, sua ancestralidade, sua irmandade e respeito para com outras Mulheres Pretas.
Sinalizando suas ações diárias enquanto posicionamento político em consumir produtos e serviços de outras Mulheres Pretas.
(…) Sou uma negra, de pele negra
De alma negra, postura negra
Tô com as negras, sou mais as negras
Se não é negra, não fala das negras…
“Zero buxixo” Letra: Afreekassia/Instrumental: G.a.B.o
Trata-se de uma gíria Para: cochicho. Entre outros sinônimos para burburinho, confusão, agitação e até fofoca.
O RAP-BA tem um verso que complementa a descrição que te dei sobre “buxixo”, “(…) deixa de fofoca e trabalha” (DaGanja Mc)
Dentro das camadas Pretas que nos cerca, a ancestralidade Afrikana se dá de varias maneiras espirituais, dentre elas está o Candomblé, e nele existe uma fala onde você transpõe para o seu Orixá por exemplo quando sua energia “não bate” com a de outra pessoa… Bem como existem relações que são necessárias, mas para uma amizade menos profunda. E celebra a existência de relações que são de alma, eis aí as eternas!
“Zero buxixo” te convida a entender que você precisa organizar suas relações para focar em seus planos.
“Wish I was a normal girl like sza”
(Queria ser uma garota normal como Sza)
Afreekassia entende pontualmente quando se põe como uma Preta raivosa, bandida e fina. E pega a visão que por questões raciais uma Mulher Preta gringa não seria sua inspiração enquanto construção identitária por não ter uma vivência de cria.
Se entender como uma Preta Rainha, e reafirmar que a sociedade precisa aceitar a ordem natural da Vida, e deixa escuro que sua postura potente não a faz inimiga de outras Mulheres Pretas.
“2022, torci pra Lina
Você se esforçou pra ser antirracista
Não cumpriu com a meta, foi só ladainha
Espero mais nada de carta coringa”
Identifica as ladainhas nas ditas lutas antirracista onde todo mundo é bom, mas ninguém quer perder privilégios. E vê a irritação estampada na cara da sociedade racista por sua autoestima elevada.
“Eu amo ser Negona” Letra: Afreekassia/Instrumental: G.a.B.o
A lírica de Afreekassia segue enaltecendo a grandiosidade em ser Uma Mulher Preta. Em se sentir à vontade com sua estética comum dentre Todas Nós, mas que consegue identificar olhares atravessados, subestimando sua capacidade intelectual, como se enaltecer sua estética fosse uma estratégia para atrair olhares e desejos quando em verdade é natural de uma “Negona”, chamar atenção por reluzir. Deixando bem escuro que não está interessada em competir, e sim focada em seu progresso, por compreender a potência de sua arte.
(…)Negona, negona, negona
Falo como negona (aham)
Ando como negona (aham)
Danço como negona (ok)
Rio como negona (aham)
Me mexo que nem negona
Eu amo ser negona (ok)…”
Rebate sinalizando sua postura em seguir pelo certo, vivências que a Rua ensina, e lembra:
(…)Se eu falar mais alto todas elas se assustam
E vão postar correndo
A Afreekassia é bruta!”
Afinal, socialmente falando toda Mulher Preta que se posiciona é taxada de agressiva.
-Afreekassia, Uma Princesinha da Baixada surgindo no Rap Nacional
Por Mara Mukami