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A voz do povo é a voz de deus: We Want Miles

Quando nós pensamos em artistas já perpetuados na gênenis da música, sempre nos surgem nomes como Art Blakey e Sonny Rollins, por exemplo. Quando o assunto chega na seara do Jazz, esses são alguns nortes absolutos, músicos de importância histórica incontestável, sem dúvida alguma, mas até eles não conquistaram o mundo sozinhos.

Sim meu caro, até nomes deste calibre estavam acompanhados por peças importantíssimas no background sonoro. Pode reparar, por trás do líder sempre existiu um base escolhida a dedo para servir como alicerce, um verdadeiro porto seguro para o groove.

Se você pegar o Art Blakey como exemplo, em suas diversas encarnações do Jazz Messengers, o baterista teve nomes importantíssimo para o desenvolvimento do Jazz – principalmente nos anos 60 e 70 – a tira colo em seus grupos. Podemos citar o trompetista Lee Morgan, o saxofonista Wayne Shorter e o pianista Thelonious Monk.

No caso do Sonny Rollins, a lenda do saxofone tenor já gravou registros marcantes junto com instrumentistas de marca maior, como o pianista Red Garland – que tocou no quinteto de Miles Davis – além do Paul Chambers (baixo) e do Philly Joe Jones (bateria).

 

Afinal de contas ninguém faz nada sozinho. Existem grandes casos de parcerias que renovaram muitos horizontes criativos para os gênios de nosso tempo. E hoje venho com um elo que poucos gostam de citar, trata-se da química entre o baixo de Marcus Miller e o trompete de Miles Davis. Prepare o play com a demencial gravação do épico e Funkay, ”We Want Miles”, lançado em 1982.

 

Line Up:
Miles Davis (trompete)
Marcus Miller (baixo)
Bill Evans (saxofone)
Mike Stern (guitarra)
Al Foster (bateria)
Mino Cinelu (percussão)

 

Track List:
”Jean-Pierre”
”Back Seat Betty”
”Fast Track”
”Jean Pierre”
”My Man’s Gone Now”
”Kix”

 

Depois de um hiato de 6 anos, Miles voltou de seu retiro espiritual atrás de mulheres e cocaína. Na realidade ele voltou para o estúdio em 1980, na época da gravação do ”The Man With The Horn”, mas até montar uma nova banda e voltar a se apresentar ao vivo, foram 6 anos de silêncio.
Mas conseguir datas não seria um problema, e assim o mestre tocou dois sets no dia 02 de julho de 1981, no antigo Newport Jazz Festival, agora Kool Jazz Festival. Só que essa foi a ”primeira apresentação para inglês ver”, pois foi o primeiro grande show após sua volta, só que o malandro já tinha feito 4 shows antes, em Chicago, no Kix, um clube de Jazz.
E depois de colocar as mãos nessas gravação (que ocorreram entre os dias 26 e 29 de junho do mesmo ano), a equipe do gênio temperamental pegou algumas faixas registradas feitas no Japão para concluir esse grande live, que sem ensaio nem nada, ficou na conserva da melhor forma possível, só administrando uma jam session.

 

 

De todo o material que o Miles registrou ao vivo, esse é sem dúvida alguma um dos meus preferidos, aliás, se você visitar a carreira do mestre, verás que para cada década de seu grande trabalho, existe no mínimo um disco ao vivo seminal.

Fora que sempre gostei de citar este aqui, pois muita gente gosta dos clichês. Ficar falando sempre do ”Dark Magus” e de outros lives fantásticos é fácil, quero ver procurar discos do mesmo nível que esta grande performance, que para variar, foi arquitetada por Teo Macero.

 

 

Sempre vi esse trabalho como uma mistura do marco ”On The Corner”, com uma jam de estúdio de Miles. Perceba que tudo não só é plenamente ouvido, como possui seu espaço, e mesmo parecendo algo até mesmo banal de se perceber, é importantíssimo de ser ressaltado.

Miles Davis foi mestre na arte de deixar sua banda de apoio solta e livre para improvisar. Poucos músicos fazem isso, em alguns momentos o trompete do americano passa batido, mas você sabe que ele está ali, apesar do show da guitarra de Mike Stern nos mais de dez minutos de ”Jean-Pierre”, por exemplo.

E não é só ele, Marcus Miller chama o slap para si sempre que lhe é conveniente, e a ciência básica da formação desse som é que o groove do negrão faz a parade para o Jazz. A bateria de Al Foster surge como uma camada e, abrilhantada pela percussão de Mino Cinelu, libera o trio Miles-Stern-Evans, que basicamente, fazem estágio no melhor emprego do mundo.

 

 

Florear a base com fritações das mais variadas ao seu bel prazer, um por vez, dois por vez, ou os três juntos, que é o que norteia toda a insanidade desse Jazz durante mais de uma hora e dez minutos. Repleto de suites lindíssimas e aquela vibração que só um disco ao vivo pode nos proporcionar, a receita dessa gravação é baseada na mais pura e singular química entre grandes mestres.

A minha preferida é ”My Man’s Gone Now”, afinal são mais de vinte minutos de pura eloquência jazzística, mas o disco como um todo é um prato cheio. São dezenas de detalhes, todos emoldurados por um sesxteto que mais parece uma orquestra.

Eis aqui um pequeno aperitivo do que Miller e Miles fizeram juntos. A dupla ainda gravou mais um ao vivo e o baixista produziu dois de seus trabalhos mais controversos, ”Tutu” e ”Amandla”, dois grandes discos lançados em 1986 e 1989 respectivamente, trabalhos que deram o que falar durante sua curta, porém interessantíssima, fase eletrônica.

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