Arthur Vinih lançou recentemente dois singles que contam sobre os laços atados com a Bahia.
Duas ideias atormentam minha mente: a primeira, mais terrível, refere-se à morte, a segunda, ser pai. A paternidade só não é mais aterrorizante que a morte porque é possível evitá-la, enquanto a morte … Espero que meus pais não leiam isso, mas se depender de mim nossa linhagem acaba quando eu der meu último suspiro.
Por isso tanto a figura do suicida quanto a do pai causam em mim profunda admiração, sem no entanto, deixar de despertar a curiosidade acerca do que leva estes seres a optarem por destinos tão nebulosos. Claro, estou compartilhando uma perspectiva subjetiva acerca da morte e da paternidade. Deixo bem claro: sou contra a paternidade apenas quando se trata de mim.
Quando vejo o entusiamo de Arthur Vinih ao longo de todo o processo que o conduziu à paternidade, o músico sempre fez questão de compartilhar estes momentos conosco em suas redes sociais, fico admirado em ver outra pessoa encontrando alegria e realização naquilo que pra mim é terrivelmente oneroso, um fardo tal qual o infligido a Sísifo por Zeus.
Admiração que só aumenta quando ouço os dois últimos singles lançados pelo compositor ponte novense neste início de 2020. São elas A Bahia e Porto Seguro, duas faixas que revelam a ligação entre Arthur e a Bahia por meio da concepção de seu filho, o pequeno Arthur Vitor. Ambas as músicas recebem a sonoridade pela qual a indústria cultural rotulou a musicalidade baiana, o axé. Nesse sentido Arthur resgata o ritmo baiano nascido nos anos 80 cujo auge comercial se deu nos anos 90, fazendo uma releitura mais intimista, equilibrada e de swing mais leve e acolhedor.
Em A Bahia o compositor rende homenagem à terra onde se deu o início de sua caminhada rumo à paternidade. Através das ondas enviadas por Iemanjá veio a inspiração para essa música, ode aos encantos experienciados junto a esposa no litoral sul da Bahia. Se em A Bahia Arthur explora as emoções ligadas à paternidade ainda em potência, em Meu Porto Seguro compartilha com seus ouvintes a paternidade em ato. Passa do momento da ansiedade e inseguranças de quem apenas tece conjecturas sobre ser pai para outra condição, na qual a paternidade está concretizada.
Em Meu Porto Seguro estamos diante de uma explosão de emoções, cuja intensidade se apresenta no sentido da letra e se espraia por todos os sons que compõem essa música. Temos uma música agitada, marcada por um groove mais carregado, com determinações ritimicas que remetem ao samba reggae. A letra fala de renovação, bem como sugere a segurança de quem através do filho consegue consolidar o projeto familiar.
Estamos diante de um elogio à paternidade, uma visão impregnada de otimismo acerca do futuro, a ideia romântica de que se renovam as esperanças quanto ao porvir, uma vez que se forma uma nova geração. Talvez uma nova geração na qual os já rabugentos pessimistas chegando a meia idade, sem qualquer energia para ao menos vislumbrar mudanças no horizonte do porvir, podem ao menos depositar alguma esperança de que algo poderá ser feito.
Nesse sentido essa duologia de Arthur Vinih reforça a concepção acerca da realização do ser humano através da família. Núcleo social responsável por garantir o porto seguro no qual seus membros sempre encontrarão o conforto e o apoio necessário para se manterem firmes no caminho da realização de seu propósito existencial. Confesso; acompanhar a trajetória, ainda curta por estar em seu início, de Arthur rumo a concretização de seu projeto familiar e toda sua empolgação em ser pai, tendo essas duas músicas como pano de fundo musical, sensibilizou-me. Não ao ponto de querer ser pai, mas ao ponto de conseguir perceber a genuinidade de toda essa vivencia do compositor através de suas músicas. Nesse sentido fica evidente o vínculo entre o compositor e sua obra.
Esses dois trabalhos são fruto de uma parceria firmada entre Arthur Vinih e os conceituadíssimos músicos Chico Amaral e Eneias Xavier. Pareceria iniciada a pouco mais de um ano e que já rendeu inúmeros trabalhos além dos dois singles por nós analisados nessa matéria. Chico Amaral assina os arranjos e toca sax tenor em ambas as composições, enquanto Eneias Xavier assina a direção musical em A Bahia e Meu Porto Seguro. As fotografias usadas para ilustrar os singles são de autoria de Wesley Costa Melo, as estátuas retratadas foram feitas pelo escultor Antônio Inácio (Boneca), ambos conterrâneos de Arthur.