Oganpazan
Destaque, Discos, Hip Hop Barril, Lançamentos, Música, Resenha

Old Dirty Bacon: “Arrancando a casca da ferida e deixando o sangue escorrer” como n’ A Origem!

Old Dirty Bacon, oriundo dos anos 90 e criado no cenário under carioca dos anos 2000, honra a história sua e minha com o seu primeiro disco A Origem!

foto por @thiagoripper

Old Dirty Bacon é um dos nossos grandes patrimônio no elemento MC da cultura Hip-Hop. Quando na primeira música após a intro, Old Dirty Bacon “rima sobre arrancar a casca da ferida e deixar o sangue escorrer”, apresenta-nos uma imagem das mais impactantes dos últimos anos dentro do rap nacional. Uma a mais, não apenas mais uma como querem nos fazer crer os donos do negócios, sejam eles bem nascidos ou meramente traidores. Eles podem até ter o capital, mas o cinismo deles nunca será capaz de dar conta do que é real! 

A luta pela sobrevivência possui muitas camadas e certamente não é o que se alcança que define aquilo que devemos ser, principalmente no capitalismo do século XXI, senão seremos todos Pablo Marçal. O que tem sido a tônica por exemplo, de empresários do rap a exemplo de Lucas Sang e sua incapacidade cognitiva e sobretudo ética de ser honesto quando fala sobre mercado. 

Afinal, quem quer resguardar pra si a missão de ser um risível Sísifo CLT, batendo um infinito martelo em pregos que entortam infinitamente, apesar da boa mira? Não é esse o destino de 99% dos artistas nacionais que fazem rap no Brasil, sobretudo a imensa maioria dos grandes nomes da história, sejam eles Stefanie ou o Matéria Prima, DaGanja ou Jackson? Um massacre infinito, como qualquer outro trabalhador? Isso, a casca de ferida limpinha ou se se quiser a pele preta gourmetizada não pode esconder…

No século XXI, escolher estar do lado do que não é vendido, do que não faz acordo, do que não se predispõe a se esvaziar em nome do mercado, de não recapitular de suas próprias loucuras conquistadas com muita dor e prazer, não é fácil. Ser Old Dirty Bacon em 2024 não é simples, e de certo é um milagre que ele ainda exista dessa forma e com essa expressão nos ofertando um disco como A Origem. Composto por 12 faixas e reunindo pessoas/artistas que se prontificaram a “colaborar”. 

A audição de A Origem para os ouvidos treinados nos informa de Bacon, as participações são importantes, por óbvio, mas não determinam o resultado e sobretudo mostram uma outra verdade inconveniente, um MC fora do jogo por tantos anos, é ainda assim à altura e além de artistas consagrados. A participação de Papatinho, Sant e Akira Presidente, são três excelentes exemplos da enganação do mercado. A arte está sempre do lado da verdade. 

Ora, não me entendam mal, eu vi o Sant nascer artisticamente lançando um “cdzinho” de 2 faixas exatamente 10 anos atrás. Para o nosso bem, esse MC que já em seu Porradão de 2 se apresentava um jovem pronto, passou pelo seu próprio inferno da indústria, hoje retomou sua carreira. O Akira que quando começou aos 12 anos, pixando ao que consta dos registros da internet, possui números consistentes e tem uma carreira muito firme, o Papatinho da mesma sorte, um beatmaker gigante hoje!

O que quis dizer é que o mercado infelizmente trabalha pela seleção, gourmetização, promoção e valorização de produtos culturais que quase nunca refletem de fato o que de melhor se está fazendo no rap. E nesse sentido, os nomes, as formas, os conteúdos do fazer são intercambiáveis e só alcançam a valorização pelos detentores do capital, seja ele de investimento, simbólico etc…

-Leia aqui a matéria que fizemos sobre o lançamento do single Sem Misericórdia do Old Dirty Bacon!

O público idiotizado ao qual não chega outras expressões do rap nacional, senão por óbvio não seria tão idiotizado, infelizmente não consegue alcançar essas verdades que estruturam aquilo que os ignorantes chamam de “cena”. Algo que não existe, uma auto enganação, que os donos da mise en scene querem nos fazer crer ser uma realidade lúdica = jogo, e com regras = talento. Nunca existiu jogo quando se trata de algum domínio da arte para além do fazer, no campo da comercialização a regra é ter dinheiro. 

E é neste sentido, que A Origem (2024) aterriza no mercado fedendo a bagulho e cachaça, escorrendo sangue sem fazer versos sangrentos e ao mesmo tempo, mal vestido, de roupas largas. Ninguém tá apertadinho, bebeu lean e tá falando da mob ou da bitch por aqui, por uma questão meramente de ponto de vista e está tudo bem. O clima também não é nostálgico, não há busca do tempo perdido e muito menos, a volta de nada. 

O Trap, o grime, o drill e aqui neste disco especialmente o boombap, o drumless, são veículos de um desacordo de princípios com a ordem das coisas através das últimas duas sonoridades do rap. De quem por nossa sorte também, apesar de ter chapado a vera, ter sido marginal na pele, nunca ficou preso por muito tempo e certamente nunca nas mãos do estado.  E reaparece agora no cenário no alto de toda a sua não fama jogando luz em nomes importantes como VND, SD9, Spike, excelentes jovens MC’s. 

Os beats de 2F U-Flow, Terror dos Beats, as rimas de um nomes tão importante como Thiago Ultra (Antiéticos) clareiam a amplitude do cenário carioca de rap. Goribeatzz e Barba Negra, assim como produtores um pouco mais jovens como CHF, El Lif Beats e o paulista Sono TWS, contribuem com excelentes beats para o álbum. Assim como Goribeatzz, o DJ Erik Scratch são parceiros das antigas desde o primeiro EP em 2016. 

-Leia a entrevista que fizemos com o MC Old Dirty Bacon

Aos 43 anos, em um cenário que vende ancestralidade mas desconhece a força da história, quiça a ancestralidade, Old Dirty Bacon nos mostra o quão importante é envelhecer sem encaretar. A água que ele bebe, é o que deve ser engarrafada e vendida, ou melhor, distribuída de graça para o povo. Sabemos, canalhas envelhecem e aqui em A Origem o que encontramos é um manual que não cabe em um disco, de como “amadurecer” sem traços de obsolescência. 

Ao longo de 12 faixas, Old Dirty Bacon mostra que continua com a cara rachada com as desigualdades e injustiças, cheio de swingue, mas sobretudo com uma indignação que se banha no seio das feridas abertas com uma caneta e respiração que nunca deixaram a angústia juventude se curar, ficar velha e reacionária. Ele não é mais um adepto do grupo da Cachaça, mais ainda assim sua água pura é muito mais chapante que qualquer bourbon ou whisky de qualquer MC bunda mole. A Origem!  

-“Arrancando a casca da ferida e deixando o sangue escorrer” como n’ A Origem, Old Dirty Bacon!

Por Danilo Cruz 

Matérias Relacionadas

Tom Misch e Yussef Dayes redefinindo os rumos da música Pop

Guilherme Espir
5 anos ago

Luedji Luna e Dj Nyack: diferentes perspectivas, mesmo objetivo

Guilherme Espir
6 anos ago

Radar Oganpazan 1: Detectadas ameaças do rap ao hardcore

Jair Cortecertu
6 anos ago
Sair da versão mobile