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A importância da volta do Underismo: Ubuntu, uma reflexão!

Um dos grupos mais interessantes surgido nos últimos anos na cena baiana de hip-hop, o Underismo voltou!!!

Senpa, Ares, Nobru e Alfa durante as gravações do clipe Peças/Drift

“Foda-se seu lean, foda-se seu hype”

Para nós parece inconteste que o coletivo Underismo surgido há pouco mais de 4, 5 anos na cena do rap baiano, se mostrou em pouco tempo uma das iniciativas mais relevantes no cenário nacional. Um grupo reunindo vários MC’s, produtores e um DJ negros brotando das ruas de Salcity com muito peso e frescor, assumindo a riqueza de nosso underground com vigor e autenticidade. Neste pouco tempo geraram um público orgânico com a qualidade dos trampos e com os “Bailes da Under”, eventos que se tornaram clássicos do rap underground local.

Do lançamento de seu EP de estreia R3$ídu0$ (2018) até o ano seguinte com o hit Pretx Chave, passando pela Demotape (2018) os caras conseguiram um resultado incrível de público e crítica. Naquela altura, acompanhando alguns dos shows dos caras, era facilmente perceptível que tínhamos na cena um grupo muito coeso artisticamente e que se complementava pois eram 8 artistas diferentes entre si. Não à toa, em apenas um ano de real atividade emplacaram hinos na cena local. Esse velho que ora escreve, via naquele momento a possibilidade de um Wu-Tang Clan cozido no azeite de dênde, com discos de grupo e solos, aos borbotões…

Algo que de certo modo se concretizou, pois todos muito jovens e com todo esse talento, rapidamente geraram trabalhos solos que fizeram história também. Podemos destacar aqui o irrepreensível disco Nada de Novo sob o Sol (2018) de Trevo e a mixtape Tipos de Rochas e Minerais (2020) lançado por Kolx pouco antes de sua saída do grupo. Com Ares tendo soltado também seu EP solo Demo Kann (2020), Senpa e Alfa tendo singles lançados, porém o grupo perdeu Ponci, Kolx e o Trevo neste mesmo ano. 

“Underismo é a peça, é o bicho, é a rua, é a maloca, é o pixo”

Reunir 8 jovens pretos, criativos é algo difícil de administrar em forma de coletivo, muitas demandas pessoais/individuais além da necessidade de tomada de decisões coletivas geraram as saídas do grupo que apesar de nunca ter acabado, arrefeceu de 2020 em diante. Temos aí, nesse meio tempo, o advento da pandemia que enfraqueceu muitos artistas independentes, e mais ainda jovens negros e periféricos em uma época da vida onde as demandas profissionais colocam o viver de música em dúvida.

Certa vez, voltando do trabalho ouvindo o EP ainda não lançado do Alfa, me peguei pensando no quanto o arrefecimento do grupo e as saídas e mesmo parada de produções – como no caso de kolx – eram uma das coisas mais tristes que eu já tinha vivido em termos de música. O sentimento que me abatia naquele momento era de morte, mas de uma morte coletiva como se uma entidade tivesse tombado. É bom lembrar, nesse mesmo período Trevo conseguia projeção nacional com sua participação no disco da Duda Beat, com um audiovisual cinematográfico e participação em programas nacionais. No entanto, apesar de saber das qualidades individuais de cada um, algo faltava, algo tinha deixado de existir. Sempre torcemos pelo sucesso individual mas o sucesso coletivo, tem sempre outro sabor. 

É muito comum vermos iniciativas coletivas negras revolucionarem, terem estreias grandiosas e depois morrerem. Pra quem acompanha a história da música basta nos lembrarmos dos pioneiros do Death e muitas outras bandas e grupos negros que não duraram mais do que dez anos juntos, mesmo tendo sucesso internacional como o Living Colour por exemplo. No Brasil então piorou, vemos surgir coletivos aqui em Salvador com variados talentos, grupos com excelentes produções, mas que por diversos motivos não conseguem levar a frente os trabalhos. Neste sentido, é fundamental resaltarmos a longevidade de uma banda como OQuadro, talvez um dos mais raros casos de grupo negro a atravessar mais de duas décadas em nosso país. 

Apesar de ateu, eu acredito na música e após ouvir o EP de Alfa repetidas vezes me peguei um dia ouvindo todos os lançamentos individuais e coletivos do Underismo. Passei a mão no telefone e liguei pra Trevo com quem estreitei laços nos últimos anos fazendo a cobertura de seus lançamentos. Em poucos minutos eu estava gritando ao telefone com os olhos marejados, a notícia foi a materialização de um desejo em tempo real: “Estou conversando com os caras, acho que o Underismo vai voltar”, ele me falou.

Em pouco tempo, comecei a ver na minha timeline o Underismo anunciada para shows, e tudo que foi mencionado acima se confirma exatamente por essa volta e aceitação/contratação imediata, os moleques possuem um molho, não o melhor, mas um bem próprio que parece agradar muito a juventude negra de Salvador. Hoje pela manhã me bati com um stories onde a atual formação da Underismo brindava uma breja em SP, ao som de um interlúdio dos Racionais MC’s – não é à toa – e automaticamente veio em mim essa confirmação. 

Há uma necessidade cada vez maior e gritante de trabalhos negros no rap nacional em formato coletivo, que aglutine talentos, que partilhe públicos, que nos mostre a possibilidade de nos fortalecermos uns aos outros. Não se enfrenta um estado genocida que produz câmara de gás pública, que mata 25 pessoas em uma favela, que arrasta uma mulher amarrada numa viatura, que esquarteja corpos, com sucesso no hype e palavras de ordem, slogans para publicar na timeline. Se a cultura hip-hop nos ensina algo fundamental é a união do povo preto. E aqui, o Underismo é um pequeno exemplo de busca na reconstrução de uma iniciativa artística vencedora.  

Isso vale para cenas, isso vale para mídias, isso vale para qualquer pretx chave que realmente quer entender e sobretudo praticar Ubuntu: 

“Eu sou por que o Underismo é!”

-A importância da volta do Underismo: Ubuntu, uma reflexão!

Por Danilo Cruz 

 

 

 

 

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