Cold Jas é uma multiartista angolana radicada no Brasil, e acaba de lançar o EP Rude com 6 faixas voltadas a uma estética boombap
“A capa do EP Rude da rapper COLD JAS ilustra de forma profunda e simbólica a jornada da artista, desde sua infância difícil marcada pela guerra civil na província do kuito Bie até sua chegada ao Brasil em busca de formatação e liberdade. A capa reflete sua resiliência, o respeito pelas pessoas que a acolheram no Brasil e a própria descoberta de sua identidade. Ao chegar na sua adolescência, COLD JAS viveu um período de adaptação em um pensionato de freiras e, naquele momento, chegou a considerar a vida religiosa como uma forma de lidar com o trauma de sua infância. A arte, criada inicialmente pelo produtor Felipe Pomar (Banha) e finalizada pelo ilustrador Frederico Amazonas, traduz essas experiências e a luta interna da rapper, destacando seu corpo como um símbolo de resistência e sua relação com o Brasil como um espaço de reconstrução e liberdade pessoal.” (Texto: Assessoria da artista)
Novamente pedindo Agô a ancestralidade, vejo-me diante da arte de Cold Jas. Mulher Preta nascida em Angola (África), multiartista. Presente na cena musical nacional e internacional há cerca de 11 anos. Cold Jas é rapper, dançarina, compositora, atriz. Veio para o Brasil aos 16 anos, morou em Sorocaba onde iniciou sua carreira de modelo.
Em 2011, muda-se para o Rio de Janeiro iniciando uma vida acadêmica, porém a arte falou mais alto, trancou o curso de Engenharia da computação para continuar sua formação artística. Presente na tv, no teatro e em séries. Em suas faixas Cold Jas, traz experiencias de uma Mulher Preta e sua relação com o mundo, quebrando as fronteiras com talento e autenticidade.
Tem uma potente contribuição na tv, cinema e teatro, foi convidada para um documentário onde fala sobre a sincronização cultural entre Angola e Brasil, foi protagonista em destino salvador pela HBO e foi uma das atrizes principais da segunda temporada da série Arcanjo Renegado. Protagonizou o clipe do Major Lazer, Ludmilla e Àttooxxá entre outros artistas.
Tenho em mãos seu novo projeto, o Ep Rude! Que conta com a produção de: Cold Jas; Dr Drumah, Felipe Pomar (Banha) e Inspector C. São seis faixas que seguem a linha combativa e estilosa da artista.
Rude (Produção: Jas Frio, Dr. Drumah)
Cold Jas
This is my
Freest freest
Freestyle
A primeira faixa ataca diretamente o capitalismo, que tem sua base epistemológica no racismo, e segue seus tentáculos: a xenofobia, o sexismo e o machismo. Socialmente e historicamente as Mulheres Pretas são as preteridas e oprimidas, mas como escreveu a artista:
“(…) a Black Girl não se curva
Que a verdade aqui não seja nua
E a tua mente crua (…)”
Cold Jas ressalta a idealização social para com uma Mulher Preta, taxada de rude só por ser Preta, ou mesmo de raivosa somente por se posicionar.
(…) Capitalismo not good
But I like
Faço pa pa parte
Também quero parte
A artista acentua que assim como o Kendrick não tolera falsidades, ou falsas ideologias, faz também referência a “Macunaíma” sua arte master e sua inteligência.
Liberdade (Produção: Jas Frio, Dr. Drumah)
“Liberdade é não ter medo” (Nina Simone)
Eunice Katheen Waymon, mais conhecida como Nina Simone, é uma das maiores pianistas, compositoras e cantoras de jazz, blues, soul e gospel de sua geração. Dona de uma voz única a cantora fez de sua musica expressão da luta pelos direitos civis da população Preta estadunidense e sua obra permanece como símbolo de resistência para as novas gerações (Camila Savá- para o Instituto Lingg).
Minhas inclinações para essa faixa são mais sentimentais por minha admiração e pela importância da Nina Simone para todas as Pessoas Pretas, bem como outras referencias essenciais para um melhor entendimento de quem se é, enquanto Pessoa Preta em Diáspora como Malcom X e Nelson Mandela, que por meio da política, fazendo da arte sua luta.
Me pego pensando que se para nós Pessoas Pretas nascidas ao vento seja tão difícil, imagina para alguém que nasceu no Continente Afrikano. Suponho que seja um eterno “rasgar-se e remendar-se”, uma luta constante para não se perder em meio ao caos de um País criado a partir da escravização de Povos.
Cold Jas referência a capacidade de blindar a mente como Malcom ensinava. Ressalta a importância de lembrarmos quem somos como ensinou Mandela. E sobreleva o conceito de Liberdade tão enfatizado pela Nina Simone.
(…) Procuro formas diferentes de fazer meu rap
Old scool bombap Old scool bombap
Niggas querem trap sem nada diferente
Old scool bombap Old scool bombap
Finalizo minha ótica sob essa faixa pesadíssima, de extrema consciência racial -, fazendo bem o papel social do Rap, que é promover a elevação mental, entendendo que a geração atual é muito rasa. Em seus “traps”, a artista destaca por sua lírica combativa.
(…) “Vivendo a liberdade na minha arte like a Nina Simone”
Átomo (Produção: Jas Frio, Dr. Drumah)
O átomo é a partícula fundamental que compõe a matéria. Possui duas estruturas: o núcleo, no qual ficam os prótons e nêutrons, e a eletrosfera, na qual estão os elétrons. Os átomos são as partículas constituintes da matéria.
“My energy femini
Is my power
Power”
A faixa seguinte, a Cold Jas usa sua lirica acentuada para trabalhar sua energia feminina, entendendo que eis aí seu poder. Quando pensamos na poderosa energia que uma Mulher Preta carrega, principalmente quando tem noção da potencia de suas ancestrais, transforma tudo que se conecta.
Energy (Jas Frio, Dr. Drumah)
Pensar na energia Afrikana de uma maneira ampla nos da uma noção do que a Cold Jas tras nessa faixa. Não tem como falar do presente sem fazer o movimento Sankofa de olhar para a história do Povo Afrikano, pensar nas chagas do periodo escravrocrata que interrompeu a historia de todo Continente.
Quando uma pessoa Preta tem uma real noção de sua ancestralidade, brota em seu peito um orgulho absurdo. Entender a riqueza material e a importancia ancestral do Continente Afrikano para a formação da sociedade que conhecemos hoje. Te ajuda a lidar melhor com o mundo. Enquanto artista, Cold Jas tem noção de como a sociedade enxerga uma Preta Poderosa. E sinaliza: “Não vamos parar!”
Okutema (Produção: Jas Frio)
“Aquitichik Txiqui Txi
Aquitichik Txiqui Txi
Aquitichik Txiqui Txi
Aquitichik Txiqui Txi
Okutema mama we
Okutema mama we
Nda kui sapuila
Nda Kui sapuila”
A faixa que fecha o ep chama-se Okutema, carrega uma letra forte , bem como todo trabalho e vida da artista. Buscando ressignificar as ideias racistas defendidas pelos Yurugus sobre as Mulheres Pretas.
“ Meu tom de pele não é pecado
Também sou filha do Sol
Eterna Matriarca
Também sou filha da Melanina”
Desde o Kemet ( nome do Egito antigo) até os dias atuais, seguimos na habilidade beirando a perfeição. Somos as grandes Matriarcas dessa terra adoecida pela ganancia. Carregamos na derme a Melanina, pigmento natural do corpo que fornece cor a pele. A melanina é também um mecanismo de defesa contra raios ultra violeta quando exposta ao sol.
A historia Afrikana, interrompida pela escravização de povos por todo mundo, precisa ser compreendida, sentida e estudada também de maneira espiritual. E o conjunto de sons que da vida à musica tem o poder nos acessar intimamente.
Esse é o meu desejo pessoal para com esse trabalho e esse escrito. Que seja leve e forte!
-Cold Jas lança o EP Rude, uma reflexão sobre o capitalismo, o feminino e a negritude!
Por Mara
Ficha Tecnica do Projeto:
Idealização; Interprete e Composição: COLD JAS
Produtor musical: Dr. Drumah
Produtor musical: Alejandro Cabelo
Produtor; Capa; Mix e Master: Felipe Pomar (Subrec)
Finalização de capa: Frederico Amazonas
Fotografia da capa: Maíra Sá Ribeiro
Ensaio fotografico para a matéria: Maria Clara Miranda