Afirmações Pan-Africanistas Em Estilo Solto!

Afirmações Pan-Africanistas surgem em meio às canções que tomam de assalto os ouvidos atentos da cena do Rap-BA, buscando combater o racismo 

Demonstration

“Se você não esta disposto a morrer por sua liberdade, retire-a do seu vocabulário”.

(Malcom X.)

“Os Panteras Negras integravam um polêmico grupo revolucionário americano, surgiu em meio à década onde a violência policial atingia os Pretos de maneira brutal e esmagadora”. Com o objetivo de lutar pelos direitos da população Preta, o ponto mais controverso para a polícia, da doutrina do grupo era a defesa da resistência armada contra a opressão dos Pretos.

Todo e qualquer Preto que se rebelar contra o sistema, será mal visto e haverá uma tentativa de abatê-lo”.

O relato acima ocorreu em meio à década de 60 nos EUA, mas, eu poderia enquanto espectadora perceber a alusão que esse novo projeto trás para a cena do Rap baiano e nacional. Todos os problemas citados em diversos registros dos Black Panters continuam sendo atuais em meio ao caos que vivemos, ou melhor, sobrevivemos.

“A Favela é o sol do mundo”

Enquanto expectadora, a categoria na qual se encaixa as faixas do “Estilo Solto”, faz repensar estruturalmente o modelo com o qual estamos acostumados a ver e ouvir o Rap, para que antes de qualquer coisa seja um Compromisso, e não mais uma Viajem que logo passa. Avaliar por meio de um comparativo com os trabalhos postos anteriormente nas ruas, onde os mesmo integrantes surgem inovando em letras, e no estilo de um modelo de show para além da cena posta.

Em meio às canções que tomam de assalto os ouvidos atentos da cena do Rap-BA, surgem gritos de afirmações Pan-africanistas que tem por base a retomada do Poder as mãos de quem sustenta toda uma estrutura de sociedade Racista e comandada com mãos de ferros daqueles que descendem de Ladrões e Traficantes caucasianos.

Frases como “O gueto é o Poder”, já se fazia presente na década de 60 em meio aos Black Panters, e se ramificou por cada década onde a melanina sempre sofreu a opressão.

A base da sociedade que se formou com o trafico de pessoas é o racismo, e para que este funcione em suas minucias a BranKkkitude deve manter Mulheres e Homens Pretos sempre as margens de uma civilidade. Midiaticamente falando todos sem nenhuma exceção, só os mais ousados, escancararam…

(O Gueto é o Poder- 2016)

“Dias melhores para o Povo Preto”

“L.e.v.o     m.i.n.h.a   v.i.d.a    c.o.m.o    u.m    c.r.i.o.l.o

S.e.m.p.r.e    f.u.g.i.t.i.v.o

C.o.r.r.o,    i.g.u.a.l    C.r.i.o.l.o

N.ã.o   s.e.i    s.e   p.o.r   c.o.r.a.g.e.m  o.u   p.o.r   s.e.r    u.m   t.o.l.o

C.h.e.f.e   P.r.e.t.o    f.i.n.o    t.i.p.o    S.é.r.i.e    O.u.r.o

(J.u.n.k)

Poetizar e musicar nossas dores são as árduas tarefas de quem se propõe a fazer Rap.

Percebendo que o Povo Preto segue sendo a engrenagem de uma cadeia alimentar que destroça suas carnes e seu sangue. O dito “Criolo” ainda no período escravocrata era aquele homem Afrikano que durante muito tempo, fora tratado como “coisa”. Os “crioulos pretos” foram desclassificados, considerados inaptos para o novo e dominante processo produtivo como mão-de-obra assalariada. Sendo tratados como sub-raça, sendo a anomalia racial que fez um país amorfo, o nosso tecido social “multicolorido” foi hierarquizado pelo tom da pele e pelas posses tecidas sob o nosso sangue e costas.

Segundo Darcy Ribeiro, ele havia sido “possuído”, e suas dúvidas enquanto mercadoria escravocrata, no ato da compra, mas, uma vez em mãos brankkkas, pairavam as dúvidas pela variedade que surgiam.

 “Perceber sua condição em Diáspora e manter-se inerte é compactuar com cada gota de sangue derramado” (Mukami)

 “…e na arena do sistema, é matar ou morrer”

G.l.a.d.i.a.d.o.r.e.s  (c.h.e.i.o.s ) d.e  (s.)  g.r.a.ç.a.s

  1. s.o.b.r.e.v.i.v.ê.n.c.i.a

V.i.g.i.a.r  a. l.í.n.g.u.a

P.a.r.a  p.o.d.e.r  (s.o.b.r.e)   v.i.v.e.r

D.i.a.n.t.e  d.a.s  L.e.i.s  d.a  R.u.a

  1. d.a.s R.u.a.s q.u.e  d.i.t.a.m  a. L.e.i

D.i.f.i.c.u.l.d.a.d.e.s

E.m  m.e.i.o a.s  r.u.a.s  c.h.e.i.a.s

B.u.r.a.c.o.s  e. t.r.a.i.r.a.g.e.n.s

S.e.r  e. T.e.r  F.a.m.í.l.i.a

C.o.m.p.r.o.m.i.s.s.o

Perceber-se enquanto Homem Preto em Diáspora é antes de tudo compreender o risco de ser considerado inimigo número um de uma sociedade infectada por uma neoplasia maligna chamada comumente de “RACISMO”.  Fazer essa leitura de uma conjuntura estruturada para “derrubar”, todo e qualquer homem Preto dentro e fora do continente Mãe.

As Favelas seguem sendo campos de batalhas diárias em meio ao sangue que jorra de cada corpo tombado após a passagem da farda que pratica o mal. A farda aqui,  segue um modelo onde todo e qualquer homem Preto, deve odiar seu igual por esse ou por aquele motivo dito “legal”, pela mesma sociedade que os transforma em ilegal diante das leis e diretrizes criadas para exterminar as “Crias da  Favela”.

Ser Homem antes mesmo de ser menino

Honrar palavras e torna- las coesas a cada ação diante de si e do Universo em desencantos…

(Real Participação: Ravi Nova Era 2016)

“Liberdade aos Irmãos”

A Pátria madrasta que atende por Brasil tem hoje a quarta maior população carcerária do mundo, mais de meio milhão de pessoas presas. A imensa maioria é Homem, Preto e pobre. Por trás dos números, cultivamos um sistema prisional violador de valores, da lei e de qualquer parâmetro razoável de eficiência. Ou seja, um sistema inaceitável, ilegal e ineficiente.

É “inaceitável”, pois, ignora qualquer padrão ético e de dignidade humana, rompendo assim com todos os valores de uma sociedade que se pretende democrática.  É também altamente discriminatório, por escolher  a dedo, e em massa sua vítimas.

Torna-se “ilegal”, pois, viola sistematicamente  leis e garantias constitucionais.  É sim,  um ciclo vicioso, onde todos perdem.  Sabemos bem qual o perfil social e racial de quem é considerado suspeito no Brasil.

Por fim, um sistema “ineficiente”,  pois, ele próprio é gerador da violência, seja por meio das facções – formadas no vácuo e incompetência de um Estado lavado com sangue preto, – ou pela forma como não recupera, nem ressocializa, tornando impossível os egressos à sociedade. 

G.l.a.d.i.a.d.o.r.e.s   n.u.n.c.a  v.o.l.t.a.m  p.r.a  c.a.s.a

P.o.r  q.u.e  a. “L.u.t.a”,  é. o. n.o.s.s.o  “L.a.r”

N.a  a.r.e.n.a  v.o.c.ê  m.o.r.r.e

O.u  v.o.c.ê  m.a.t.a

A.m.a.r.g.a  R.o.t.i.n.a  N.i.g.g.a

(Gladiadores- Estilo Solto 2016)

“Na trilha das onças e a paz pelo caminho”

Na busca individual e coletiva pela sobrevivência faz com que, aqueles excluídos das fatias do bolo de uma pátria que segue assassinando os fetos que tentara abortar desde seu sequestro de casa. O jogo do sistema historicamente põe o Homem Preto Periférico como algoz de um sistema que repudia cada uma de suas células. Nas Favelas, o papel a ser cumprido é doloroso pois, a “peça” a ser encenada foi criada para matar,  sem importar o método a ser utilizado.

“O tráfico de drogas é um trabalho. Embora informal e ilegal, o tráfico de substancias ilegais tem regras, obrigações e um contrato a ser cumprido. E, como qualquer atividade capitalista, precisa garantir sua estruturação para manter com segurança o consumo e ponte com seu consumidor. O jovem que entra no tráfico conhece bem o contrato que assina, porém esse mesmo lugar que pode lhe custar a vida, é o que lhe mantém vivo.”

“ L.i.b.e.r.d.a.d.e     c.a.n.t.o.u

  1. r.a.j.a.d.a  p.r.o   c.é.u

N.ó.s   t.a.m.b.é.m   v.a.i    c.a.i.r,    m.a s,    f.a.z    n.o.s.s.o    p.a.p.e.l

N.o.i.s    t.á   n.o   g.a.m.e    j.o.g.a.n.d.o    c.e.r.t.o

N.a    p.a.r.a.n.o.i.a   b.e.i.r.a.n.d.o    o.   t e.t.o ”

(F.e.l.i.p.e    G.u.r.i.h)

(Joquers- Estilo Solto 2016)

“…Eu ainda vou pixar o teu nome na Lua”

Das maneiras de sobrevivência, atos generosos sempre foram vistos em toda e qualquer comunidade Preta. Ainda no período onde a escravidão era escancarada, conseguíamos manter laços em meio as desgraças impostas. O sentimento de bem estar na presença,  fez e faz energias se reencontrarem por séculos… A sensação de já ter vivido tal situação com um alguém “estranho”, é devido à memória da pele, dos cabelos.

A necessidade de criar laços, é antes de tudo uma tentativa de sobreviver com nossa arma mais forte, o Amor.

Sentimento essencial ao bem estar de todo e qualquer ser. Mas, num jogo onde só um lado morre, o Amor entre Pretos se faz a maior arma que podemos ter.

– Por uma questão de lógica, se todas as quebradas se unirem?

– UGANGUE! (Mas, aí já é outra matéria, rs)

Se todos os guetos se unirem, o governo cai…

Mas, eu tenho esperanças como diria o poeta:

“Quero ver quando a Favela subir o morro, e não for carnaval”

 

(Maldade- Estilo Solto 2016)

 

“Você disse que era bom, e a favela ouviu…”

Em meio a negação de nossa historia, o sistema criou uma ferramenta mundial capaz de distrair e destruir todo e qualquer vestígio africano que tenhamos e passemos a creditar que toda a mentira contada até hoje é a nossa história. Nossa cultura e costumes antigos, sendo distorcidos de maneira escancarada na programação diária de toda e qualquer rede televisiva.

A televisão mostra o que devemos ter para alcançar um status social, que por uma lógica social não é um espaço para a comunidade Preta.

Compre! Vista! Beba! Coma! Viva melhor! Coma! Seja! Faça!

Frases impactantes de comando fazem com que todo e qualquer problema apareça, tenha uma maquiagem adequada para que você finja que as cadeias estão lotadas, que Mulheres Pretas são vistas e postas como prostitutas sociais, que a sociedade arrasta, forja e some com corpos Pretos.

Perceber a Brankkkitude se apropriando de tudo que sempre foi nosso e nunca podemos fazer, gera o asco da maldade que impulsiona o revide, a busca pelo que é nosso por direitos!

“Fogo na Babilônia, a brankkkitude vai  cair”

É.  S.i.m!

T.a    b.a.t.e.n.d.o

S.o.l.t.e,   e.s.s.a   s.o.l.t.a

  1. a.í,   B.e.r.l.o.t.a   c.o.m.o   é.  q.u.e   t.a   a.s   c.o.n.t.a?

T.a   a.q.u.i,   t.a    a.q.u.i!

M.i.n.h.a   F.a.z.e.n.d.a   G.r.a.n.d.e

M.i.n.h.a   q.u.e.b.r.a.d.a

F.a.z.e.n.d.a    G.a.n.g.u.e

M.i.n.h.a   F.a.m.í.l.i.a   t.á    u.n.i.d.a

E.l.a     d.i.z   q.u.e    e.s.t.a   c.o.m    s.a.u.d.a.d.e.s

N.o.t.i.c.i.a    r.u.i.m, n.ã.o   q.u.e.r.o   n.e.m    s.a.b.e.r

É.   o.   o.u.r.o!

  1. q.u.e  v.o.c.ê   d.i.s.s.e?

 (V.a.i    c.h.e.g.a.r… V.a.i   c.h.e.g.a.r)

 Nossas conversas na porta de casa…

Costumo dizer que tudo é sim uma questão de costumes, e o ato de reunir-se a noite e madrugada a fora é sim um costume africano! Chegar a essa conclusão é muito simples, basta analisar em qual horário ainda no período escravocrata que fomos brutalmente inseridos, podíamos tentar conversar sobre a atual desgraça de cada época.

A necessidade de se unir para a sobrevivência fez surgir inúmeras linguagens dentro de um mesmo grupo.

O jeito de falar vem das variações que nos foram  impostas. O ensino que te induz a ter medo, a seguir uma série de regras que nem quem as criou seguiu. Regras codificadas por artigos para nos incriminar, nos fazer contradizer nossas verdades. As mentiras seguem como verdades num sistema infectado pelo câncer do racismo.

O sistema só entende a fala da violência em suas diversas formas.

O gueto segue cheio de dialetos e maneiras de gritar, as dores abafadas em cada peito preto marcado tal qual um animal rumo ao seu abatedouro diário. Os homens- meninos que trazem na derme a função de não ser pego, são os mesmos que trazem a face das verdades- problemas-anseios de todo Nigga de cada quebrada em Afrika ou espalhados ao vento. A felicidade em partilhar de quem comunga os mesmos planos e comunga de pensamentos africanos, faz jus ao brilho dos olhos cheios de sonhos tal qual uma arraia que no imenso céu, colore e da vida as feridas nas almas da  Favela.

(Contenção- Estilo Solto 2016)

“A cada palavra Afrikana lançada ao vento, traz-se da ancestralidade a força necessária para os dias de lutas e honras”

Por Mara Mukami X.

 

Imagem Destacada: Fernando Gomes 

 

 

 

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